domingo, julho 30, 2006
mudar de vida ....asseio...



Livro do Desassossego 1923. - Bernardo Soares

Fotos: por um fio invisivel
sexta-feira, julho 28, 2006
Rua dos Douradores , em Lisboa

Na alma sou egual.

Bem sei que há ilhas ao Sul

Se eu tivesse o mundo na mão, trocava-o, estou certo, por um bilhete para a Rua dos Douradores.
O Livro do Desassossego - B. Soares /Fernando Pessoa
Fotos : aqui
Postal - vende-se em Sintra, por informação da t.
quarta-feira, julho 26, 2006
Do Cais do Sodré ao Oriente...

Faço a paysagem ter para mim os efeitos da música, envocar-me imagens visuaes – curioso e difficilimo triumpho do êxtase, tão difficil porque o agente evocativo é da mesma ordem de sensações que o que as há-de evocar. O meu triumpho máximo no género foi quando, a certa hora ambígua de aspecto e luz olhando para o Caes do Sodré nitidamente o vi um pagode chinez com estranhos guizos nas pontas dos telhados como chapéus absurdos – curioso pagode chinez pintado no espaço, sobre o espaço-setim, não sei como, sobre o espaço que perdura a abominável terceira dimensão.
É possível a certas almas sentir uma dor profunda por a paysagem pintada n’um abano chinês não ter trez dimensões.
Poderei ir buscar riqueza ao Oriente, mas não a riqueza de alma, porque a riqueza de minha alma sou eu, e eu estou onde estou, sem Oriente ou com ele.
NÃO PERCA ESTE VIDEO
http://www.visualgui.com/motion/BonjourVietnam.html
Bernardo Soares – O Livro do Desassossego (1930)
terça-feira, julho 25, 2006
jardins

Não sei que cousa estranha existe na substancia intima dos jardins citadinos que só a posso sentir bem quando não me sinto bem a mim.



Nesses dias estou errado. Mas, pelo menos em certo modo, estou feliz. Se me distraio, julgo que tenho realmente casa, lar, a onde volte. Se me esqueço, sou normal, poupado para um fim, escovo um outro fato e leio um jornal todo.
12Abril 1930
Livro do Desassossego - B Soares /Fernando Pessoa
Fotos :aqui
segunda-feira, julho 24, 2006
O eléctrico chamado PAZ


A vida é para nós o que concebemos nella. Para o rustico cujo campo proprio lhe é tudo, esse campo é um império. Para o Cesar cujo império lhe é ainda pouco, esse imperio é um campo. O pobre possue um império; o grande possue um campo. Na verdade, não possuimos mais que as nossas sensações; nellas, pois, que não no que elas vêem, temos que fundamentar a realidade da nossa vida.
O Livro do Desassossego - Bernardo Soares - texto de 27.6.1930, mantendo a escrita original.
Fotos :aqui
Fundamentar a realidade da nossa vida e encontrarmos a PAZ : além
e vermos este video http://www.youtube.com/watch?v=dqCiKiEAYYk e e baixarmos a velocidade para sentirmos a sensação de REFLECTIR.
sábado, julho 22, 2006
estio


Se eu fora outro, penso, este seria para mim um dia feliz, pois o sentiria sem pensar n'elle.Concluiria com uma alegria de antecipação o meu trabalho normal - aquele que me é monotonamente annormal todos os dias. Tomaria o carro para Benfica, com amigos combinados. Jantariamos em pleno fim de sol, entre hortas. A alegria em que estariamos seria parte da paisagem, e por todos, quantos nos vissem, reconhecida como de ali.
As cerejeiras eram a alegria da serra por altura das ceifas. Raro era o linhar e a horta que a seu tempo não ostentasse a rica vestimenta de rubis. Generosas e abundantes, comiam todos à farta, desde o rapazio aos pardais, que se pelam por elas. Mais bonito em Portugal só as laranjeiras. A rirem-se e oferecerem-se a toda a gente por cima das paredes e das demarcações, não podiam as cerejas deixar de atrair o olho lampeiro do Lêndeas, que imaginou explorá-las a bem da sua cupidez. ...(e) Teve para um ano de balcão... uma mixórdia enjoativa que os labregos, a emborcá-la, a revessarem em ânsias a cama das tripas.
Um tubo de borracha vinha sub-repticio, por detrás dos cascos, com a candonga abominável. E o freguês de rol estava com muita sorte se no cálix entrasse meia dose de bagaceira.
Assim enriquecera o tiborneiro. E sempre a coçar-se, e caspa e lendeas a cairem-lhe como granizo para a gola do casaco, e a dizer mal da porca da vida.
Quando os Lobos Uivam - Aquilino Ribeiro
sexta-feira, julho 21, 2006
Manhã a raiar sobre a cidade

Sinto, ao sentil-a, uma grande esperança. Manhã, primavera,esperança estão ligados em musica pela mesma intenção melódica; estão ligados na alma pela mesma memoria de uma egual intenção. ..reconheço que o que tenho que esperar é que este dia acabe, como todos os dias. A razão tambem vê a aurora.


Lembro-me de repente de quando era creança, e via, como hoje não posso ver, a manhã raiar sobre a cidade. Ela não raiava para mim, mas para a vida, porque então eu era a vida. Via a manhã e tinha alegria; hoje vejo a manhã, e tenho alegria, e fico triste. Vejo como via, mas por traz dos olhos vejo-me vendo; e só isto se me obscurece o sol e o verde das árvores é velho e as flores murcham antes de apparecidas.
Já vi tudo, ainda o que nunca vi, nem o que nunca verei.
Livro do Desassossego - Bernardo Soares , 1932
Fotos: http://por-um-fio-invisivel.blogspot.com/
quinta-feira, julho 20, 2006
Coisas de nada

O Caixa aberto deante dos olhos cuja vida sonha com todos os orientes; a piada inofensiva do chefe do escritório que ofende todo o universo;
Todos têm um chefe de escritório com a piada sempre inoportuna e a alma fora do universo em seu conjunto.



Todos nós , que sonhamos e pensamos , somos ajudantes e guarda-livros num Armazém de fazendas, ou de outra qualquer fazenda em uma Baixa qualquer. Escrituramos e perdemos; somamos e passamos, fechamos o balanço e o saldo invisivel é sempre contra nós.
E tudo espera, aberto e decorado, o Rei que virá, e já chega, que a poeira do cortejo é uma nova névoa no oriente lento, e as lanças luzem já na distância com uma madrugada sua.
O Livro do Desassossego - Bernardo Soares
FOTOS : http://por-um-fio-invisivel.blogspot.com/
Nota para a t. : Fiz um esforço para não voltar ao teu blog para não querer ver o que lá tinhas; tentei responder ao teu post; vamos ver o que daqui resulta...
quarta-feira, julho 19, 2006
Rua Nova do Almada - Lisboa



Senti

Ora as costas d'este homem dormem. Todo elle, que caminha adeante de mim com passada egual à minha, dorme. Vae inconsciente. Vive inconsciente. Dorme, porque todos dormimos. Toda a gente é um sonho. Ninguém sabe o que faz. Dormimos a vida inteira, eternas creanças do Destino. Porisso sinto uma ternura informe e immensa por toda a humanidade infantil, por toda vida social dormente, por todos , por tudo.
Livro do Desassossego - Bernardo Soares
Fotos: http://por-um-fio-invisivel.blogspot.com/
Nota: Há meses atrás fiz um desafio com a Por um Fio, em que publicámos posts de diversos livros de Eça, sem nada combinado previamente. Ela tem fotos maravilhosas e hoje lembrei-me de ilustrar os devaneios de Pessoa , com essas imagens. Qual o meu espanto quando vejo que também ela está a "reeditar" o Desassossego dando-lhe uns tons como só ela sabe!!! Não percam.
terça-feira, julho 18, 2006
acção




Vivemos pela acção, isto é, pela vontade.
Agir, eis a inteligência verdadeira..Serei o que quiser. Mas tenho que querer o que for. O êxito está em ter êxito, e não em ter condições de êxito. Condições de palácio tem qualquer terra larga, mas onde estará o palácio se o não fizerem ali?
segunda-feira, julho 17, 2006
Seara em foice alheia ...ou Sintra em negativo?

Aqui, havia até gentes de todo o lado, de todas as cores, africanos, timores , portugueses e alguns daquele branco deslavado – deviam ser os tais russos ou ucranianos, desses países de leste que tanto se falava.


O órgão começou a tocar e ouviam-se cânticos; todos se levantaram. Ah!, nesta igreja o padre entra lá pelo fundo, pela porta principal, como se viesse da rua e atravessa o corredor, levando à frente um cortejo. O padre é um homem novo , usa sandálias e veste calça de ganga. O cabelo cortado rente, esgrouviado, cheio de redemoinhos. Joaquina olhou-o desconfiada. Quando chegou lá ao cimo do altar saudou os fiéis e disse-lhes até para agradecerem a sauna gratuita que tinham ali à disposição. Todos sorriram…Mas o mais interessante veio depois , na hora do sermão. O tal padre falou das injustiças que havia; falou de futebol e daquela história dos prémios dos jogadores que havia uns que nem queriam pagar o IRS. Não estava certo, não senhor, pensava Joaquina, que eles que andavam aos pontapés à bola ganhassem tanto dinheirinho e ainda achavam que não deviam pagar impostos como os outros que mal lhes chegava o ordenado até ao fim do mês e passavam tantas dificuldades. Depois o padre falou ainda, doutro caso injusto, que um jornal de Sintra dera a noticia. O senhor presidente da Câmara de Sintra tinha pensado atribuir um subsidio – Joaquina até nem percebeu bem se eram 20.000€uros ou 20.000 contos, credo tanto dinheiro ! àquele que aparecia muito na TVI, o tal José Castelo-Branco, esse mesmo, só porque o homenzinho tinha feito umas obras lá no seu palacete, pois então. Mas a ideia não foi avante, ainda bem, tanta gente sem casa e sem comer e ele a desperdiçar assim as verbas…
Ao fim, o padre veio pôr-se à saída da porta principal e falava um pouco com todos. Joaquina também foi lá cumprimentá-lo e até se afoitou a dizer-lhe que tinha gostado muito do sermão, sim senhor, que lá na terrinha não havia nada daquelas maneiras, mal acabava a missa cada um ia à sua vida e o padre não ficava a falar com ninguém!

domingo, julho 16, 2006
ideal



A sensibilidade de Malharmé dentro do estilo de Vieira; sonhar como Verlaine no corpo de Horácio, ser Homero ao luar.
Sentir tudo de todas as maneiras; saber pensar com as emoções e sentir com o pensamento; não desejar muito senão com a imaginação; sofrer com coquetterie; ver claro para escrever justo; conhecer-se com fingimento e táctica, naturalizar-se differente e com todos os documentos; em summa, usar por dentro todas as sensações, descascando-as até Deus; mas embrulhar de novo e repor na montra como aquelle caixeiro que de aqui estou vendo com as latas pequenas da graxa da nova marca.


Há imagens nos recantos de livros que vivem mais nitidamente que muito homem e muita mulher…
sábado, julho 15, 2006
O mundo numa cadeira





O Livro do Desassossego - por Bernardo Soares /Fernando Pessoa
quinta-feira, julho 13, 2006
FÉRIAS 2



E partiram rumo à casa da Avó de um deles para no dia seguinte irem até ao tal Parque de Campismo.

Os Pais de Rita também partiram de férias, sozinhos, sem a filha. Uma experiência nova também para eles, na descoberta de outros lugares, outros laços, outras conversas, outros olhares. Visitaram a família, sim, visitaram locais distantes, que viram com outras cores e deram novos tons aos diálogos e aos gestos. Reencontraram-se na ternura e na cumplicidade dos seus momentos sem pressas, sem horas marcadas. Telefonavam a Rita primeiro com alguma ansiedade, depois com uma certa saudade, com algum entusiasmo porque tudo estava a correr bem, ultrapassadas as primeiras dificuldades de chegar aos locais, montar as tendas, preparar as coisas. Afinal, no dia previsto para o regresso , Rita até pediu se podiam ficar para quinta-feira; sem que ninguém pudesse prever que iria chover a potes e trovejar forte, mas nem esse pequeno contratempo prejudicou aqueles dias…


Depois, já eles vinham de regresso a casa, nessa manhã em que saíam os resultados dos exames do 12º ano, Rita voltou a ligar - abençoados telemóveis. Tinha passado os exames todos com óptimas notas, os colegas também.
Amanhã vão matricular-se na Faculdade!
